Conheça o livro "As Mais Belas Trilhas da Patagônia"
Torres del Paine, El Chaltén, Bariloche, Ushuaia, Villarrica, Cerro Castillo, Dientes de Navarino e Parque Patagonia
Circuito O em Torres del Paine, Chile – Relato de trekking

A linha vermelha mostra o Circuito O, sendo que o Circuito W corresponde ao trajeto entre o acampamento Grey e o acampamento Las Torres.
Considerado um dos melhores destinos de trekking do mundo, Torres del Paine tem dois roteiros que estão a cada ano mais populares: o Circuito O, também chamado de Circuito Grande, e o Circuito W, que é parte do O e cobre a maior parte das paisagens mais bonitas.
Situado no sul do Chile, em 1959 foi criado o Parque Nacional e, em 1978, declarado pela Unesco como Reserva da Biosfera. Em seus 181.000 hectares há diversas trilhas de um dia, além de áreas que podem ser visitadas de carro ou barco, fazendo com que o parque seja acessível para qualquer pessoa, desde quem gosta de passar vários dias acampando até quem quer viajar com todo conforto. Minha escolha foi pelo Circuito O, uma trilha a pé com 135 km, que é normalmente feita em 8 dias.
Apesar de não ter grandes altitudes, com máxima de 1.200 metros no Paso John Gardner, o inverno é bastante rigoroso e até no verão é possível nevar, apesar de não ser muito comum. O que é comum, em se tratando do clima, é haver grandes variações em pouco tempo. Isso sem falar no vento, que pode fazer a sensação térmica cair para baixo de zero mesmo durante o dia. Ou, caso você tenha mais sorte que eu, pode passar alguns dias caminhando apenas de camiseta.
Passagens compradas, roteiro estudado, equipamentos de foto, camping, roupas e comida para 9 dias na mochila cargueira. E não é que a mochila de 80 litros ficou pequena? O peso disso tudo: pouco mais de trinta quilos, que felizmente foi diminuindo a cada refeição.
Apesar da longa distância, não é preciso ser um super atleta para fazer esse circuito, especialmente se você optar por dormir e comer nos refúgios ou alugar barraca nos acampamentos. A elevação total acumulada é de 6.800 metros, o que não é muito se dividirmos pela distância, de 135 km.
Dia 1 – Hosteria Las Torres ao Acampamento Serón
14 km – Elevação acumulada de 350 metros
O primeiro dia é o mais tranqüilo, mesmo as poucas subidas do caminho não são íngremes, servindo como uma boa adaptação para o resto do circuito. Depois de quatro horas caminhando em ritmo lento, conversando com um californiano radicado no Havaí, chegamos ao acampamento Serón. Dizem que, quando esquenta, o Valle Encantado fica todo florido com margaridas, mas quando fui, no fim de novembro, elas ainda não haviam aparecido, provavelmente pelo frio que insistia em não ir embora.

À direita está a Hosteria Las Torres, onde a trilha começa, e à esquerda o Ecocamp

Valle Encantado

Vista do acampamento Serón
Dia 2 – Acampamento Serón ao Dickson
19,5 km – Elevação acumulada de 550 metros
Às sete da manhã, dentro da barraca, 8 graus. Temperatura boa, mas durante a noite deve ter feito bastante frio, tanto que nas montanhas ao redor do acampamento havia muito mais neve que no dia anterior. Porém fazia sol, confirmando o que haviam me falado sobre as constantes mudanças de clima.
Café-da-manhã na barriga, mochila nas costas e pé na trilha, que já começa mais bonita que no primeiro dia, entre belas árvores e margeando o Rio Paine.
Pena que o sol se escondeu uma hora depois, já que a vista do Lago Paine deve ser linda com o céu azul refletido em sua água. Paciência, logo muda de novo… Ou não! A partir daí, a caminhada foi feita novamente com o céu totalmente branco e com nuvens baixas, que bloqueavam a vista das montanhas e do glaciar Dickson.

Vista do acampamento Serón

Em quase todo o trajeto a trilha está muito bem marcada

Rio Paine

Lago Paine

Acampamento Dickson
Dia 3 – Acampamento Dickson ao Los Perros
12,5 km – Elevação acumulada de 700 metros
Este não deveria ser um dia difícil, pois apesar de ser o começo da subida para o Paso John Gardner, a distância é curta. Mas não foi bem assim… A chuva que havia começado na tarde do dia anterior variava de intensidade, mas não parava. Tomei o café-da-manhã dentro da barraca, de onde não saí até às dez, quando percebi que nem sempre o clima muda rapidamente em Torres del Paine. Ao menos agora a chuva estava fraca e foi mais fácil desmontar acampamento e começar a caminhar, mas durante todo o dia a câmera ficou guardada, já que ainda não havia passado pelas principais paisagens e não quis colocar o equipamento em risco.
A trilha é bonita e atravessa uma floresta pouco densa, mas com árvores enormes. Por diversas vezes o caminho cruza um belo rio e suas corredeiras, mas no momento que saí do abrigo das árvores, o vento estava tão forte que mal permitia caminhar, e com quando cheguei nos 500 metros de altitude, a chuva deu lugar à neve.
Ao chegar no Los Perros fui logo para uma tenda onde havia uma fornalha e todos os trilheiros estavam lá, tentando se aquecer, secar roupas e equipamentos, um alívio! Além disso, as horas passadas nesse abrigo foram ótimas para conhecer as outras pessoas que estavam fazendo o Circuito O, inclusive os únicos quatro chilenos com quem conversei durante os oito dias. Alemães, israelenses, franceses e americanos conheci aos montes, mas chilenos eram poucos em seu próprio país.

Raposa procurando comida em volta das barracas no acampamento Los Perros
Dia 4 – Acampamento Los Perros ao Grey
18 km – Elevação acumulada de 1.350 metros
Como esse prometia ser o dia mais cansativo, acordei bem cedo (dentro da barraca, apenas 3 graus) e, na hora de sair, vi um grupo de americanos partindo, então me juntei a eles para ter mais segurança e alguém para conversar.
Não sei se por estar psicologicamente preparado para um caminho que acreditava ser duro ou se foi pela boa conversa, mas a subida do Paso John Gardner não foi difícil como pensei. No começo passamos por áreas de charco, mas era sempre possível pisar em troncos jogados sobre a lama. Depois veio a neve, que em alguns pontos ia até o joelho, mas bastou seguir o caminho marcado para alcançar o cume, sempre curtindo um visual incrível!
Por falar em visual, a vista para o outro lado do Paso é das mais impressionantes que já tive! Infelizmente não dá para mostrar a dimensão do Glaciar Grey nas fotos, já que não é possível colocar um ponto de referência nele, mas mesmo com o tempo encoberto, a vista tirou mais o fôlego que a caminhada!
Vencida a subida, só faltava descer, descer e descer… De 1.200 metros até o acampamento, a apenas 50 metros de altitude. O acampamento Grey já faz parte do Circuito W, o lado mais civilizado do parque, então a quantidade de pessoas é muito maior. Se nos acampamentos exclusivos do Circuito O havia em média 10 barracas, aqui havia bem mais que 30. Infelizmente, também há muita gente despreparada para acampar em uma região que é tão frágil quanto bela. Como exemplo, em 27 de dezembro de 2011, poucas semanas depois que parti, um israelense perdeu controle sobre o fogo que criou e o vento espalhou as chamas com rapidez, queimando uma área de 14 mil hectares, 7% do parque! Alguns anos antes foi um tcheco que causou um grande incêndio, também por descuido, mas o estrago é o mesmo, seja o fogo intencional ou não.

Início da subida para o Paso John Gardner

Travessia do Paso John Gardner

Travessia do Paso John Gardner

Glaciar Grey visto do cume do Paso

Glaciar Grey

Trilheiros a caminho do acampamento Grey

Pica-pau no acampamento Los Guardas
Dia 5 – Acampamento Grey ao Paine Grande
17,5 km – Elevação acumulada de 650 metros
Dia de caminhada fácil, com subidas leves e vistas incríveis para a geleira e lago Grey, mas o melhor está no próprio acampamento Paine Grande. Logo atrás do hotel há um mirante fantástico e, para minha sorte, o sol resolveu aparecer quando cheguei, depois de um dia inteiro com tempo fechado. Hora de fotografar e, depois, ficar sentado curtindo o visual… Até a chuva reaparecer e me mandar de volta para a barraca.

Glaciar e Lago Grey

Iceberg que se desprendeu do Glaciar Grey

Río Olguín

Acampamento e hotel Paine Grande

Lago Pehoé, Paine Grande (à esquerda) e Cuernos del Paine (à direita do Paine Grande. Entre as duas montanhas fica o Valle del Francés.
Dia 6 – Acampamento Paine Grande ao Los Cuernos
25,0 km – Elevação acumulada de 1.700 metros
Apesar de ser o dia com maior distância e elevação acumulada, são apenas 13 km carregando a mochila, já que é possível deixá-la no acampamento Italiano antes de fazer o bate-volta no Valle del Francés. O vale tem algumas das paisagens mais bonitas do parque, com rios, geleiras e vista tanto para as montanhas que compõe o Paine Grande como para os Cuernos del Paine. Infelizmente, nesse dia as nuvens estavam baixas, encobrindo os picos a maior parte do tempo.
Lago Pehoé Lago Skottsberg Valle del Francés Foto em 360° feita pouco antes do Mirador Británico. A vista é parecida com o Mirador Británico, mas não tão próximo das montanhas, então gosto mais da vista desse ponto que do mirante oficial. Cerros Espada, Hoja e Máscara Lago Nordenskjöld Lago Nordenskjöld Paine Grande e Cuernos del Paine iluminados pela lua
Dia 7 – Acampamento Los Cuernos ao Torres
17,0 km – Elevação acumulada de 950 metros
A primeira metade do caminho é feita junto ao lago Nordenskjöld, até começar a subida para as Torres del Paine. O último acampamento com refúgio e boa estrutura é o Chileno, mas optei por seguir em frente e dormir no acampamento Torres (atenção, o Acampamento Torres, bem próximo ao lago em frente às Torres del Paine, não existe mais), que apesar de ter como estrutura apenas um banheiro imundo, fica a somente 45 minutos do mirante. Como a vista mais bonita acontece ao nascer do sol, vale a pena dormir mais perto para ter uma hora a mais de sono.

Lago Nordenskjöld

Subida para as Torres del Paine
Dia 8 – Acampamento Torres à Hosteria Las Torres
12,5 km – Elevação acumulada de 500 metros
Acordar às três e meia da madrugada depois de uma semana caminhando pode parecer difícil… E é mesmo! Mas tudo bem, ver o sol pintar de laranja as montanhas que dão nome ao parque vale um último esforço de todos que trocaram o conforto de suas casas para passar oito dias sentindo frio, sono e cansaço, mas que foram recompensados com vistas impressionantes de um dos circuitos de trekking mais belos e diversos do mundo!

Amanhecer nas Torres del Paine
Conheça o livro "As Mais Belas Trilhas da Patagônia"
Torres del Paine, El Chaltén, Bariloche, Ushuaia, Villarrica, Cerro Castillo, Dientes de Navarino e Parque Patagonia